Paulo D'auria declama no Sarau na Casa Mário de Andrade...O atual movimento dos versos é festa diária e nos proporciona leque de amizades crescente. Em cada sarau, novos companheiros passam a fazer parte de nosso convívio.
Conheci o entrevistado de hoje no recital dos Poetas da Casa. Dali em diante foram vários encontros e a poesia, claro, sempre a pauta preferida.
O Circulando Versos abre novo arquivo e nele pretendemos mostrar e conhecer um pouco mais dos anônimos poetas, cujo fazer poético é encarado como verdadeira missão.
Com vocês, Paulo Virgilio D'Auria, pertencente ao grupo Poetas do Tietê. Ele tem 44 anos, é casado e mora na Freguesia do Ó.
Pé - Como a poesia passou a fazer parte da sua vida? Qual autor preferido?
Paulo - Escrevo poesia desde criança. Recentemente encontrei um poema escrito aos 11 anos. A poesia é algo inexplicável que já estava dentro de mim quando nasci. Meu poeta preferido é Drummond.
Pé - Como você vê o atual movimento poético? A quantidade de saraus espalhados por Sampa.
Paulo - Não sei se podemos ver com clareza a importância desse movimento em torno da poesia, talvez isso só possa ser mensurado daqui há muitos anos. De qualquer maneira, esses saraus alargam o foco da poesia contemporânea para uma poesia mais popular, de fácil entendimento, bem diferente da poesia publicada pelas editoras especializadas e da poesia contemporânea estudada nas academias, que é uma poesia intelectualizada demais.
Pé - A cultura (em nosso caso a poesia) pode levar a uma melhora política e social no país?
Paulo - Tenho certeza que sim. O problema do país é o pouco investimento em educação e cultura.O país vive uma crise ética e o brasileiro só vai se livrar dessa mordaça de ignorância com cultura e e educação.
Pé - A literatura está a serviço do social?
Paulo - A literatura tem que viver o seu tempo, ser um testemunho do lugar onde é produzida. A literatura na Suécia talvez não precise estar a serviço do social, mas no Brasil, se não o fizer, estará se omitindo. Quem produz literatura em um país como o Brasil é um privilegiado que teve acesso à cultura, e ele precisa devolver à sociedade um pouco desse privilégio que ela lhe propiciou. Não é uma questão de obrigação, mas de consciência.
Pé - O comentário que fica?
Paulo - Acessem Poetas do Tietê: http://poetasdotiete.blogspot.com
Fiquem com poema de Paulo D'Auria...
Televisão de Cachorro
O menino de rua
Aprendeu a jogar videogame
No computador do supermercado,
Como se um motorista de praça
Num atalho para o corcovado
Pousasse na lua,
Como se um sertanejo
De uma lágrima
Fizesse chuva,
Como se um apaixonado,
De tão enamorado,
Tirando a sorte no realejo,
Ouvisse anjos.
Mas a graça do moleque
Não durou muito, sinto muito,
Pivete, disse o gerente,
Mas isso é brinquedo de gente.
- E eu sou o quê?
- Sei lá quem é você!
Mas esse computador branco,
Limpo e resplandecente
Não é fliperama!
Cadê sua mãe, me chama,
Me chama ela aqui!
- Não tenho mãe, não senhor,
Sou preto, sujo e pobre,
Mas sou mais gente
Que esse computador!
Mais gente que o nobre vendedor!
Nesta altura dos acontecimentos
O segurança entrou na dança
Expulsando o garoto do estabelecimento,
- Circulando, se manda!
Na vitrine, tal qual televisão de cachorro,
Ainda namorou o PC,
Agora, lá vai o moleque subindo o morro,
Como se o taxista acabasse extraviado,
De tanto pranto, o sertanejo terminasse descarnado,
E sozinho, o pobre namorado.
Assim termina o samba
Do menino que só queria ser feliz,
Mas a vida não quis.
(Entrevista via e-mail: as respostas às perguntas e o poema foram enviados por Paulo D'Auria ao blogueiro Marco Pezão)