quarta-feira, 13 de abril de 2011

Poesia no Ar

Bar do Zé Batidão, Piraporinha, zona sul da capital. Sede da Cooperifa onde se realiza um dos saraus mais concorridos de sampa.

Esta é dona Edite, poeta e declamadora. Participante ativa, sempre e sempre a nos emocionar.


Hoje é quarta-feira, noite consagrada a poesia. Dez anos já se passaram. Muita luta em prol da literatura periférica.


Aí o poeta Sergio Vaz, idealizador do Poesia no Ar. Evento marcante promovido pela Cooperifa e que acontece há quatro anos.

Durante o sarau, poetas declamando, a produção enche os balões que vão tomando conta do teto.

A liberdade e respeito é uma caracterista. Muito amor, muito amor.


Casa cheia. No mínimo oitenta poetas se increvem para declamar nesta festa dos versos que acontece logo mais às 21 horas deste 12 de abril.

E haja bixiga pra encher.


Só estando lá pra sentir o clima.


Após o sarau todos ganham a rua.


As poesias são amarradas nos balões.


E coro invade a noite, Uh! Cooperifa!


Buscando outros céus,


E de pés na terra,

O poeta sonha.


Com novo amanhecer.

terça-feira, 12 de abril de 2011

A gravidez de Ana Paula

Marco Pezão


(midraxe hagadá)


Filha única de um casal de baixa renda, Ana Paula é o xodó da família. O pai, João Antonio, pedreiro de profissão, trabalha nas proximidades do bairro onde mora, no Jd Capelinha.


Nunca foi de muita conversa, tem poucos amigos, e, depois do serviço, gosta de tomar uma cachacinha no bar do Clidão, antes de ir pra casa.


Dona Irene, a esposa, ajuda no sustento da família, como arrumadeira num hospital da zona sul.


Ana Paula menstruou aos 12 anos; o corpo desenvolvido de moça formada. Nas ruas, um coro de assobios a perseguem. Mas, se manteve distante dos relacionamentos próprios da idade.


Terminou o curso ginasial e decidiu fazer o colegial em uma escola técnica no centro de São Paulo.


A mãe relutou em consentir. Dona Irene preferia tê-la sob as vistas, e muito tempo gastou em conversa franca com a menina.


As precauções que deveria tomar. O cuidado com os rapazes que insistiam em lhe telefonar. Pois, apesar de ser jovem ainda, é bem verdade que se tornara um mulherão.


Começo do ano letivo. Em abril a moça completou 17 anos e tudo parecia normal. Porém, num sábado à tarde, Ana Paula, na cozinha, diz pra mãe que a regra está atrasada.


Dona Irene gelou dos pés a cabeça. Preocupada foi à farmácia e comprou o teste gravidez. Retornou ansiosa e fez Ana Paula urinar imediatamente.


O mundo pareceu desabar. O resultado deu positivo. Ana Paula está grávida! Dona Irene passou a gritar, chorar, se lamentar. Tantos foram os conselhos, e nada adiantou!


- Quero saber quem é o maldito desse canalha que te desonrou? Fale, Ana Paula! Quem é o amaldiçoado?


Assustada, Ana Paula, corre ao quarto. Em prantos, pega o telefone e faz uma ligação. Enquanto isso a mãe esbravejava:


- Abra essa porta! Vá já falar com seu pai.


“Seo” João Antonio, a que tudo ouvia, continuou impassível diante da televisão... Passados vinte minutos, uma Ferrari, último tipo, vermelha, estaciona diante da casa.


Do carrão desce um homem maduro, elegante, cabelo cheios e grisalhos. Veste terno impecável e sapatos de cromo alemão.


Aciona a campainha, Ana Paula vai atendê-lo. E, depois de um breve diálogo, o leva à sala. Seguem as apresentações formais, ele diz se chamar Oliveira Candido.


O homem senta no sofá e começa a falar:


- Bem, Ana Paula me informou o incidente. Devo dizer que devido a minha situação familiar, eu não posso me casar, no momento. Mas, assumo a situação e cuidarei de todos os quesitos:


Se nascer menina, posso dar a ela três lojas no shopping Ibirapuera, duas casas, um apartamento no Guarujá e uma conta com 500.000 reais...


Se for menino, ele terá duas fábricas rentáveis e, claro, 500.000 reais de poupança...


Se gêmeos, também terão duas indústrias confiáveis e 500.000 reais na conta de cada um...


No caso de um eventual aborto, eu ...


Seo João Antonio, que, até então, se mantivera calado, levanta da poltrona e põe a mão sobre o ombro de Oliveira Cândido, dizendo:


- Meu filho, no caso de acontecer essa terrível tragédia, eu o aconselho: come Ana Paula, de novo!

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Massacre



Marco Pezão


Manchetes diárias do caso. 12 crianças mortas, outras tantas feridas. Feridas jamais esquecidas por aqueles que realmente sentem a dor da perda.


“Se matamos uma só pessoa somos assassinos. Se matamos milhões de pessoas celebram-nos como herois. Felicitam-se os que inventam bombas para matar mulheres e crianças. Só se consegue ter êxito neste mundo fazendo as coisas em grande escala”, grande Chaplim.


Entre nós, a violência sofrida pelos “brasileirinhos”, no dia a dia, tornou-se algo corriqueiro. Esta, nada ou pouco, chama atenção da mídia. A mídia televisiva, pra sua satisfação, explora banho de sangue à última gota.


O abominável episódio de Realengo é apenas mais uma página a ser virada. Na periferia, dizia um personagem: a gente esquece uma morte noutra que já chegou.


O fato vem sendo desenhado há muito tempo. Os baixos salários dos professores. Salas de aulas superlotadas. Vagas insuficientes. Falta de motivação e expectativa dos estudantes, além da precariedade de transportes, etc, etc..., isso não é violência? No caso do Rio, a violência atingiu seu clímax.


Disciplina e respeito se adquire no convívio. É moeda de troca. Mas o poder absoluto emanado de governos demagogicamente democráticos impede relações justas de competitividade.


A atrocidade praticada pelo tal é resultado de uma política social nefasta exercida por quem elegemos para serem nossos representantes na busca de uma vida digna.


O tal foi pro saco. As crianças pros túmulos. Por favor, não venham querer me convencer que o imperdoável ato tem, por fundo, responsabilidade de seita ou religião que eventualmente o sujeito seguia.


A triste cena é, sim, fruto da explorada mesmice enraizada em solo brasileiro desde seu princípio. “O homem que nesta terra é tratado como fera, há de ser fera”, né Augusto?


Demagogia. Demagógicas condolências. Políticos e seus partidos devem ser eleitos. Eleitos, sim, nossos inimigos. Afinal, pra que precisamos de políticos?